sábado, 7 de abril de 2018

A Separação.

Era 07 de abril de 1999.
Ali, há 19 anos, começou uma História rica em detalhes. -que é aonde tudo mora mesmo: Viver é uma colcha de detalhes.

A gente deu um chute a gol: quando viu, era casamento.
Quando viu, era a casa alugada.
Quando viu, era a chave do primeiro imóvel.
Quando viu, era olhar e saber o que o outro tava pensando.
Quando viu, eram inúmeras viagens terrenas e astrais.
E que, somadas, compõem a Nossa História.

E nem bem viu, era desencontro.
E nem bem viu, era dor.
E nem bem viu, era já outra língua.
E nem bem viu, era sexo no piloto automático.
E... nem bem viu, já não era mais.


Não foi culpa de ninguém. Não há culpa no desenlace.
Não foi premeditado. Não dá pra prever a Vida.
As pessoas permanecem em sintonia enquanto for encaixe.
Quando deixa de ser, cada um segue seu rumo.
Seja dentro ou fora da relação: cada um segue seu rumo.
Ainda que de corpo presente: cada um segue -dentro de si- seu rumo.

Ele queria viver [outra coisa]. E não havia erro nenhum nisso.
Eu queria viver [aquela vida] de outra forma. E não havia erro nenhum nisso.

Não havia culpa no porvir.
Não dava pra gente se culpar por expectativas diferentes.
Não deveria ser eterno aquilo que já não tinha.

- Até quando essa vida de 20 anos de casado? –eu disse.
- Eu acho que você sempre teve razão. –respondeu.

E assim começou a saga de dez meses e meio e dois quilos de dor a cada osso quebrado e mexido.


Eu urrava de dor emocional enquanto ele ruía por dentro.
Eu chorava dia e noite, ele sofria dia e noite, pela certeza de que deveria acabar.
Eu não dormia. Ele rolava pela cama.
Eu o acordava à noite pra fazer DR. Ele parecia um zumbi.
Eu o culpava. Ele se culpava.
Eu me culpava. Ele me culpava.
Eu olhava praquilo que a gente havia se tornado e sentia dó. Ele, pena.
Eu achava que era possível reverter. [E eu tentei, Meodeos, como eu tentei]... Ele também.
Eu não quis vê-lo nunca mais. Ele sentiu desamor.
Eu quis que ele nunca mais fosse feliz. Ele torcia pra que eu fosse o quanto antes.
Eu quis comer o mundo. [E eu comi o mundo]. Ele parou de comer.
Eu quis voltar no tempo e nunca tê-lo conhecido. Ele me fez o favor, fingindo nunca ter me conhecido.
Eu quis propor uma vida de fachada enquanto ele temia que eu nunca mais deixasse ele partir.
Eu quis que tudo fosse pro inferno, ele temia abrir a porta do céu pra voar.
Eu pensei que era meu fim. Ele temeu pelo recomeço.
Eu achei que nunca mais eu iria me recuperar. Ele achou que nunca mais fosse se recuperar.
Eu tive medo. Ele teve pânico.

Na minha cabeça era pra sempre.
Na cabeça dele também.

Foram nove anos e meio ao lado daquele homem.
E são já dez anos sem aquele homem. –daquela maneira, é claro.

Eu olho pra trás e... Nossa!
Parece uma eternidade.

Uma eternidade e umas sete vidas de lá pra cá.
Para ambos.


Hoje, olho para ele e não o reconheço.
E ainda bem!

[Se bem que... mentira. Eu já o reconheço. Nos -nem tão- novos moldes. E morro de orgulho do que ele se tornou.]

Quando a gente se encontra, é como voltar pra varanda da casa da minha Avó, em que a gente ria de tudo, aos 18 anos, ainda Amigos.
E como a gente foi feliz!

E como a gente não foi...
E como é necessário aceitar finais. E começos.
E como é preciso saber quando parar. E não descarrilar.
E como é tudo muito mais objetivo que dramático e a gente sequer se dá conta.
E como eu sou mais madura depois daquilo.
E como ele é bom caráter num mundo de gente média.

Ainda bem que ele teve coragem.

- Eu preciso viver.

Ainda bem que eu resisti.

- Eu vim pra tua vida, era esse monte de fita de videocassete. Eu vou, e essas tralhas ainda aí. É por isso que tá acabando: eu não suportei. –risadas em meio às lágrimas e aquele mundo de caixas na sala do apartamento.

Era um turbilhão de sentimento.
Era muita intensidade.
Era muito tudo junto: a gente terminou de se criar.
Sabe lá o que é isso?

A gente se pariu na frente um do outro.
Ele me ajudou a sobreviver.
Eu o ajudei a renascer.
A gente se amava muito, ainda.

Ele se culpou.

- Eu sou a cereja no seu bolo de bosta.

Eu abracei.

- Fica tranquilo: a gente casou junto e a gente vai se separar junto.


E assim foi. Contrariando nossas terapeutas [que achavam que a gente deveria romper feito faca amolada], a gente abriu o laço em parceria: ele puxou, meio roto, o lado dele da fita; eu arrastei, toda puída, a minha metade da fita.

Risos, choros, ódios eternos, respeito inabalável, amor [quase] incondicional, parceria pra vida, admiração, tapas, gritos, apelos, atropelos... Vida.

Vida.

Assim foi.
A gente rompeu aquele ovo que a gente tinha criado e que... Meodeos: como doía arrancar aquela placenta do nosso entorno.

“A ave sai do ovo. O ovo é o mundo. Quem quiser nascer, precisa destruir um mundo.”

Não sobrou nada além de escombros. Além das cascas.
E deles, a gente construiu o que somos hoje. A gente se retroalimentou.

Eu agradeço à Vida por tudo o que fomos.
E o que deixamos de ser.
Só assim nos tornamos o que somos hoje.
A gente terminou de se criar.
Sabe lá o que é isso?
A gente se ama muito, eterno.

Vou dizer que a gente foi bastante competente: nossa obra é fantástica: somos phodda! Hahaha! =)


Se tem coisa que ele não lida na vida é com desgaste.

- To passando. Não quero relacionamento, não, Meu: dão muito trabalho. To cansado de gente louca. Vai ver o problema sou eu.

- Olha Cara: você é chato, mas não é difícil conviver contigo, não. Não acho isso não. Deixa quieto e segue o baile.


Se tem uma coisa que eu preciso na vida é da aprovação dele.

- Poha, Cara: qual é o meu problema? Eu meto tanto medo assim, Meo?

- Cê tem um gênio terrível, mas é um mulherão da poha.


Como se fosse hoje, me lembro: num dado momento, eu olhei praquele lado da cama, praquele homem e pensei que não mais o conhecia.
Dormi, vencida pelo choro.

Quando acordei, havia um espelho e, nele, a minha imagem.

Eu tinha duas alternativas.

Uma delas, era culpar a vida que o esperava além de mim.


A outra?


Bem...

... eu escolhi me olhar quando ele escolheu seguir.


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Em tempo: obrigada, Mozzi.

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